Numa entrevista para o jornal ECO +M, Susana Albuquerque, Presidente do Clube da Criatividade de Portugal, aborda temas como o impacto da Inteligência Artificial na publicidade, o rebranding do Clube, os grandes desafios da indústria, a recandidatura para a Direção do CCP, os concursos e o custo da invisibilidade.
"Creio que aquilo que interessa, mais do que criar silos, é conseguir envolver todas as pessoas que têm uma voz ativa e que têm uma contribuição para que a criatividade seja inovadora, forte, relevante e aportadora de negócio." Susana Albuquerque
O rebranding do Clube de Criativos de Portugal para Clube da Criatividade de Portugal foi um dos grandes desafios do mandato anterior, enquanto Presidente do Clube. Com esta nova reeleição, a Direção pretende dar continuidade a esse trabalho de inclusão no meio da criatividade.
"Foi muito positivo. A intuição dizia-nos que era o passo certo, mas a prática vem comprovar que era um movimento mais necessário até do que achávamos. Agora há muito pouco tempo aconteceu o mesmo movimento em Espanha, inspirado por nós. Tivemos cá a Belén Coca, uma diretora criativa independente que está associada ao movimento Mais Mulheres Criativas, e ela conheceu a nossa mudança de nome, achou que era uma belíssima ideia, levou a proposta para Espanha e replicaram lá, foi votado há cerca de um mês."
"A publicidade é sempre um reflexo dos tempos que estamos a viver, é sempre um reflexo cultural. E, de facto, têm sido períodos tão negros. Durante a pandemia, as mensagens foram muito “estamos todos juntos, vamos todos ajudar”. Depois a pandemia passou, mais rapidamente do que imaginávamos voltámos à nossa vida normal e parece que já nem nos lembramos que passamos por aquilo – meio episódio traumático –, mas vieram outros problemas bastante graves, como a guerra na Europa. Agora temos também Trump outra vez nos Estados Unidos. Há tanta ansiedade em relação ao futuro… Inteligência artificial (IA), é tudo uns quadros negros pela frente. E, de facto, o humor está ali, está acessível, permite-nos descomprimir, permite-nos relaxar, permite-nos sentir que somos humanos e que rir é das melhores coisas que podemos fazer. E a publicidade sempre teve essa capacidade."
Sobre o impacto da Inteligência Artificial, a Presidente do Clube acrescenta que:
"Está a ter impacto em tudo. Nas agências, neste momento, está a ser uma ferramenta muito útil para fazer aquele trabalho um bocadinho mais manual, como seja criar imagens para maquetizar, para fazer storyboards através de todos aqueles programas como o Midjourney, seja através do ChatGPT, que é uma excelente ferramenta de investigação, de brainstorming."
" (...) até agora é uma ferramenta que nos ajuda. Somos nós ao comando, a dizer faz isto, faz aquilo, faz-me uma imagem tal, pesquisa-me tal. Mas, muito rapidamente, é fácil imaginar que a IA vai começar a ser agente, agente no sentido de tomar decisões por nós. (...) A partir do momento em que não decide, a publicidade vai ter que impactar quem? Vamos começar a fazer publicidade para impactar os robôs? Porque a nossa disciplina, a publicidade, vive de impactar as pessoas que decidem."
Susana Albuquerque reflete ainda sobre os grandes desafios que a indústria criativa enfrenta em 2025.
"É sempre muito difícil fazer futurologia, sobretudo nos tempos que correm. Acho que ninguém sabe muito bem o que vai acontecer politicamente, na Europa e nos EUA, e depois a economia vem sempre muito a reboque dos índices de confiança, do otimismo, essa parte acho que é um bocadinho imprevisível. Em relação à indústria, têm-se visto muitas fusões nas multinacionais, cada vez menos marcas e muitas estruturas independentes a proliferarem. Essa diversidade, de que falava no mercado publicitário, acho que se vai manter. Vão existir cada vez mais players a oferecer estruturas de dimensões muito diferentes, mas com muitas pessoas que vieram das networks e que vão ter um bom produto para oferecer. Portanto, um mercado muito concorrencial."
"Depois, do ponto de vista das remunerações, temos sempre um problema, que é encontrar o valor certo para remunerar o nosso trabalho. Somos uma indústria bastante empobrecida, que continua numa luta por defender margens e conseguir cobrar aquilo que o mercado vale, e que o talento que o faz merece receber. É uma cadeia de valor que está muito erodida e é uma luta que está em cima da mesa."
Falou sobre um dos pontos do programa deste novo mandato enquanto Presidente do Clube, a aproximação aos anunciantes:
"Ainda há um bocadinho esta ideia de nós e eles. Obviamente que temos pontos de vista diferentes, e é de salutar que assim seja, estamos a olhar do lado de dentro da criatividade e do produto criativo – como sermos inovadores, como sermos fortes –e temos uma visão de fora do produto."
"Apesar de nós estarmos em lados diferentes da realidade, acho que temos de ter uma linguagem comum. Acho que é muito importante e acho que devemos todos crescer como mercado, se conseguirmos ter um idioma parecido, se tivermos anunciantes que gostam de criatividade, que consomem criatividade."
Ainda sobre a recandidatura para o Biénio 2024-2026 do Clube da Criatividade de Portugal, acrescenta que:
"Hesitei muito. Vou passar por mentirosa, porque já tinha dito a muita gente que ia ser o meu último mandato e agora voltei com a palavra atrás. E também já ouvi muitos comentários que dizem que isto parece uma ditadura."
"Sou uma mentirosa, assumo, mas sou uma mentirosa por uma boa causa. Tentámos passar o testemunho, e ainda chegámos a falar com uma pessoa que nos parecia ser a pessoa certa para vir a seguir, mas que depois acabou por não querer. Tem sido sempre assim, temos sempre esperança que apareça uma lista ao lado, mas não acontece. Em relação à ditadura, acho muito injusto, esta direção sempre quis muito abrir-se e incluir as pessoas."
"O facto de estarmos dispostos a dar o nosso tempo livre para trabalhar para o Clube como voluntários, nunca é uma coisa fechada, é sempre uma coisa que está aberta à participação de quem se quiser juntar. Portanto, é uma ditadura entre aspas, porque todas as pessoas que tiverem ideias que de alguma forma beneficiem o nosso mercado e a nossa indústria, nós vamos querer acolher, vamos querer agregar e vamos querer ajudar a implementar. É uma “ditadura democrática”.
Fonte: ECO +M
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